Carnaval com dinheiro público

Em plena madrugada, vereadores aprovam reajuste de 80% nos próprios salários

Vereadores aprovaram aumento e a notícia ganhou repercussão nacional, mas o prefeito prometeu “cortar o barato” e vetar o projeto

Dois Irmãos – Se o Brasil é o País do Carnaval, quem imaginaria que uma Câmara de Vereadores teria sessão justamente na segunda-feira do feriadão. Pois em Dois Irmãos isso aconteceu e os vereadores tinham um bom motivo – bom, só para eles! Na última segunda, os vereadores se reuniram para uma sessão em pleno feriadão para conceder às suas funções um reajuste salarial de 80% em votação que aconteceu durante a madrugada.
De volta do recesso que começou em 15 de dezembro, os parlamentares abriram os trabalhos deste ano em causa própria. Na primeira sessão do ano, aprovaram à 0h25min desta terça-feira, por sete votos a um, reajuste de 80% nos vencimentos de vereadores, secretários municipais, prefeito e vice. A sessão inicou às 19h de terça e terminou faltando 10 minutos para a 1h da madrugada. A imprensa da capital estava em peso na Câmara de Vereadores. Três canais de TV, rádios e jornais dividiam o espaço com moradores que foram à Câmara para se mostrar contra o aumento. Os vereadores tentaram “matar o povo e a imprensa no cansaço”, falando abobrinhas e outros assuntos, para deixar o aumento envolto em uma cortina de fumaça. Durante a semana, alguns políticos acusaram a imprensa de “pegar muito no pé” dos vereadores por ter noticiado o aumento que, na época, era mentira e “coisa da cabeça dos jornalistas”, mas na segunda-feira se confirmou quem tinha razão e que o projeto estava sendo feito às escondidas. Depois de falarem sobre diversos assuntos sem muita relevância para aquela noite, os quais, aliás, já haviam sido debatidos dezenas de vezes no ano passado, os vereadores foram para a votação. Cada qual tentou justificar o injustificável, falando o óbvio e, no fim das contas, o resultado que todos previam: projeto aprovado por 7 x 1, com foto contrário do único petista, que foi chamado pelos colegas de demagogo e outras acusações devido ao fato de ser contra o aumento.

OS “AMIGOS” DO POVO
Votaram a favor: o autor do projeto, vereador Elony Nyland (PP), Marcel van Hattem (PP), Anselmo Schenkel (PP), Jair Quilin (PDT), Edemar Rambo (PDT), Paulo Quadri (PMDB) e Roberto Stoffel (PMDB).
O único a votar contra o aumento foi o vereador do PT, Gerson Miguel Schwengber.
O presidente da Câmara, Ademir Berlitz (PP) não precisou votar, pois só vota em caso de empate. Mas ele já havia confirmado que era a favor do aumento.

OS SALÁRIOS EM DOIS IRMÃOS
Cargo - salário atual - com aumento
Vereador : R$ 893,65 - R$ 1.608, 57
Secretário: R$ 2.527,93 - R$ 4.550,27
Vice-pref: R$ 2.901,22 - R% 4.607,97
Prefeito : R$ 5.119,96 - R$ 9.215,92


JUSTIFICAR O INJUSTIFICÁVEL
Na tribuna, o que se viu foi alguns vereadores tentando justificar o injustificável. Vieram desculpas e motivos para justificar o aumento de todos os lados. Um disse que gasta muito dinheiro com rifa, outro disse que é um incansável lutador do povo, outro justificou que está pagando para trabalhar, outro ainda foi mais longe e disse que é o menor salário dos 17 municípios vizinhos, porém, “esqueceu” de consultar o município de Morro Reuter, o mais próximo de Dois Irmãos, onde os vereadores ganham cerca de R$ 800,00. Outro disse que o aumento não é para eles, mas somente para os que forem eleitos em outubro, mas alguém tem dúvida de que a esmagadora maioria deles vai tentar a reeleição e, aliás, todos eles acreditam que já estão reeleitos?
Os vereadores Marcel Van Hatten e Elony Nyland, ambos do PP, argumentaram que há 16 anos os subsídios dos parlamentares não sofrem reajuste, mas esqueceram de dizer que os valores são corrigidos quase todos os anos. Para Elony, o reajuste recuperaria apenas um terço das perdas salariais. Paulinho Quadri também defendeu o aumento, principalmente dos secretários, enquanto Roberto Stoffel e Anselmo Schenkel só usaram a tribuna no final, quando a imprensa tinha ido embora e a poeira tinha baixado. A única voz contra o aumento entre os parlamentares era do vereador Gerson Miguel Schwengber (PT). Para ele, deveria haver um reajuste, mas não no patamar sugerido. Miguel disse também que os custos do aumento complicariam as finanças da cidade, que já passa há três anos por uma grave crise. O tema repercutiu negativamente junto à comunidade local e no dia de ontem o que se percebeu foi muita reclamação por parte do povo. Aliás, teve vereador “sumindo do mapa” para não enfrentar as críticas, pois nem telefone estavam atendendo. Embora o assunto tenha sido levado à discussão justamente no meio do Carnaval, o período não teria sido escolhido para fugir à pressão popular. No entanto, na terça a Câmara estava fechada devido ao “ponto facultativo”. A notícia deu repercussão nacional, com matérias inclusive em jornais cariocas e paulistas. Um conhecido comentarista de TV gaúcha chegou a chamar os vereadores de “larápios”, dizendo que são os larápios que se aproveitam da madrugada para agir.



Prefeito Renato garante que vai vetar o aumento

Em férias no litoral catarinense, o prefeito Renato Dexheimer (PMDB) mostrou-se surpreso ao saber dos valores exorbitantes. “Se cair pra mim eu vou vetar. No que se refere ao Executivo, vou vetar. Eu não sabia até agora os valores, mas se é este absurdo que você está me falando, no que eu puder vetar, vou vetar”, garantiu Renato, que está em férias até dia 16. No entanto, que se refere ao Legislativo, o prefeito disse que não pretende mudar, pois os vereadores “devem saber o que fazem e a população deve julgar”.
Segundo Renato, ele havia ficado sabendo da idéia do aumento de salários através do jornal há alguns dias atrás. Já naquela oportunidade havia dito que “não era a hora” para isso. Ontem, quando ficou sabendo que o salário do prefeito saltaria de R$ 5 mil para R$ 9.215,92, falou na hora, que vetará.
Como Renato volta somente dia 16, até lá o prefeito em exercício é Gilberto Schaeffer, que tem poder para sancionar ou vetar o projeto. Ontem a tarde, Chepa não atendeu ao telefone, sendo assim, fica a dúvida se ele terá bom senso ou não.